terça-feira, 23 de junho de 2015

Duas notas importantes sobre a Grécia

                                                                

                         (Tsipras se encontra com Putin em Moscou, 8 de abril de 2015)                                                                                                             
Na noite de ontem, 22, foi realizada em Bruxelas, na Bélgica, mais uma rodada de negociações para tentar solucionar a grave crise econômica grega. Abaixo duas notas sobre o assunto.

1) Interessante notar o tratamento que a imprensa ocidental e russa dão ao caso. A notícia destacada pelo site da CNN afirma que a "Europa dá uma cautelosa boa-vinda ao plano grego", que prevê reformas econômicas, aumento de impostos e corte de despesas. Segundo Donal Tusk, presidente do Conselho Europeu e que presidiu o encontro em Bruxelas, todas as partes estariam comprometidas com um acordo, que ainda depende de futuras negociações. A notícia destaca o protesto feito no dia de hoje, 23, em frente ao Parlamento grego que pedia para que o país se mantivesse na zona do euro.

Por outro lado, algumas das notícias destacadas pela Sputnik, órgão de mídia russo e fortemente crítico dos países ocidentais, apresenta uma União Europeia na defensiva com relação à crise grega. Uma notícia destaca que a mencionada reunião em Bruxelas acabou sem acordo entre as partes, e destacou os protestos realizados em diversos países europeus no último domingo, 21, que criticavam a pressão econômica dos credores sobre a Grécia. Outra notícia da última sexta-feira, 19, destacava a entrevista de um deputado do Syriza que a saída da Grécia da zona do euro faria mal ao bloco. Já uma terceira notícia destacava a declaração do primeiro-ministro grego Alexis Tsipras no Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo de que a "Europa não é o centro do universo", numa clara crítica à tentativa do Ocidente continuar se prevalecendo economicamente, e destacou o papel da Rússia no mundo.

2) Na medida em que vasculho os pormenores das relações entre Grécia e Rússia tenho algumas surpresas. O ideólogo russo Alexander Dugin não teve contato apenas com membros do Syriza, uma coligação de partidos de extrema-esquerda que atualmente está no poder na Grécia, como ele e seus colegas ativistas teriam contribuído para a aliança entre o Syriza com ninguém menos que o recém-fundado partido de extrema-direita Gregos Independentes. Após as eleições de janeiro deste ano, ambos partidos formaram uma aliança para governar o país. O que eles têm em comum? São críticos do capitalismo liberal, eurocéticos (opõe-se à atual União Europeia) e, acima de tudo, anti-austeridade. Um quarto ponto, não-ideológico mas prático, são os contatos entre membros de ambos os partidos com ativistas russos antiocidentais, entre eles Dugin. Em maio 2014, mesmo após iniciada a crise na Ucrânia, Alexis Tsipras teve um encontro oficial com membros do alto-escalão do governo russo que estava na lista de sanções do Ocidente. Na ocasião, ele declarou que a paz na Ucrânia não seria possível sem a remoção dos elementos nazifascistas daquele governo. Já em setembro, numa votação do Parlamento Europeu para ratificar o Acordo de Associação EU-Ucrânia, todos os seis membros do Syriza votaram contra. E na Grécia, um dos membros do Gregos Independentes e deputado regional fundou em 2001 o Movimento Social Patriótico Aliança Grego-Russa, do qual é chefe, e que busca promover uma maior cooperação entre os dois países.

Outros acontecimentos relevantes ocorreram em janeiro de 2015, mês das eleições na Grécia: na primeira metade do mês um dos membros do GI viajou em visita a Moscou; no dia 23, dois dias antes das eleições, o presidente da Aliança Grego-Russa visitou o consulado geral da Rússia em Thessalonika para negociar a renovação da cooperação entre os dois países; e no dia 26, dia seguinte às eleições, o embaixador russo na Grécia, Andrei Maslov, fez uma visita à sede do Syriza em Atenas.

Com a aliança entre dois partidos abertamente pró-Rússia, sendo o Syriza, segundo Dugin, "anti-atlantista" (leia-se: antiocidental) fica difícil a Grécia se posicionar abertamente contra Moscou. Alexis Tsipras já se manifestou contrário às sanções do Ocidente para com a Rússia, e seu partido, como o mencionado, votou unanimemente contra uma maior integração da Ucrânia à União Europeia, cujo acordo contraria frontalmente os planos de Putin e abre portas para uma futura integração desse país com a OTAN.

Por outro lado, é importante observar que tanto o governo grego como a mídia pró-Rússia não se colocam favoráveis à saída da Grécia do bloco. A mídia tece fortes críticas aos líderes europeus, mas ao mesmo tempo destaca os prejuízos e as insatisfações que uma saída grega causaria à Europa. A exemplo do que comentei na postagem anterior, é interesse russo uma Grécia integrada à UE mas não submetida a ela de forma a permitir que Moscou possa influenciar a política do bloco desde dentro e aproximar os países ocidentais da sua esfera.

Para a Rússia é melhor uma Europa unida e não dividida, mas a seu favor. E contra os EUA.

Nenhum comentário:

Postar um comentário